quinta-feira, 23 de maio de 2013

Valério não é troféu e denúncia é "criação mental", diz advogado

STF julga caso conhecido como "mensalão"; publicitário teria se associado criminalmente com seus sócios para desviar dinheiro público e receber contratos do governo

  

Do Portal Terra

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A defesa do empresário Marcos Valério, apontado como operador do mensalão, inaugurou a fase mais técnica do julgamento. Marcelo Leonardo, advogado do empresário mineiro, contrapôs cada uma das nove acusações apelando para perícias e provas documentais que, segundo ele, teriam sido desconsideradas pelo Ministério Público. "Marcos Valério não é troféu ou personagem a ser sacrificado em altar midiático. Foi vítima de implacável mídia opressiva, sem direito a defesa, cujo veredicto este Supremo Tribunal Federal não poderá atender, porque a culpa exclusiva é do Ministério Público que não se descincumbiu do seu mister (trabalho)", acusou Leonardo.

Demonstrando conhecimento profundo do processo, o advogado iniciou a defesa de Valério desqualificando as provas apresentadas pelo procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Segundo Leonardo, apenas as provas colhidas durante a fase processual podem servir de base acusatória, e não depoimentos concedidos na fase de inquérito ou na CPMI dos Correios. "A defesa citou apenas provas colhidas no processo. Tudo que veio antes é prova sem contraditório e, portanto, passível de anulação", afirmou o advogado, que iniciou a defesa pedindo a absolvição de Valério pelo crime de formação de quadrilha.

Segundo a denúncia, Valério teria se associado criminalmente com seus sócios para desviar dinheiro público e receber contratos publicitários do governo. "Há uma banalização no Brasil da acusação de quadrilha. Se afastados os crimes imputados, resta apenas a associação de pessoas que têm uma relação societária. E o vínculo societário não é suficiente para enquadrar crime de quadrilha", defendeu Leonardo.

O advogado também questionou as acusações de corrupção ativa, sobre as quais Marcos Valério teria repassado dinheiro a parlamentares em troca de apoio político ao governo. Para a defesa, partido político não é funcionário público e, consequentemente, não pode ser passível de corrupção por pessoa física ou jurídica. "Não houve compra de votos por falta de correlação entre os saques e os votos. Não há prova suficiente para a condenação de que a finalidade dos repasses era a compra de partidos políticos, mas financiamento de despesas de campanha."

Marcelo Leonardo acusou uma suposta tentativa de manipulação de peritos sobre documentos da Visanet, que teria repassado R$ 2,9 milhões à agência DNA Propaganda, de Valério, a título de "bônus de volume". O advogado explicou que o mecanismo de remuneração das agências de publicidade é legal e não envolveu recursos públicos, uma vez que a Visanet, apesar de manter contrato com o Banco do Brasil, não é uma empresa pública.

"Como essa informação era falsa, a defesa requereu que os peritos fossem ouvidos em audiência. Eu mesmo questionei os peritos. O sujeito se esfregou todo na cadeira, mas não soube apontar onde os documentos permitiriam concluir que a Visanet teria recebido recursos tendo como origem o Banco do Brasil. É um exemplo de falsa perícia. E é impressionante o desprezo pela prova colhida em contraditório na denúncia", afirmou.

Sobre a acusação de que teria dado R$ 50 mil ao ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP), hoje deputado federal e candidato à prefeitura de Osasco, para receber tratamento privilegiado em uma licitação, Marcelo Leonardo chamou de "criação mental" a denúncia do Ministério Público.
"É uma criação mental do acusador. Da licitação participaram sete outras licitantes. Foram ouvidos dirigentes dessas outras licitantes. Informam eles que não houve nenhum privilegio à SMP&B (agência de Valério) e nenhuma empresa recorreu do resultado", completou.

O mensalão 

Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.

No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.

Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.

O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.

A então presidente do Banco Rural Kátia Rabello e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e do irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.



Revista Isto É

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