quinta-feira, 28 de novembro de 2013

Honduras: do golpe ao Estado policial?

O provável novo presidente promete "fazer o que for preciso" contra o crime e o tráfico de drogas, mas seus críticos temem até onde ele pode ir. Por José Antonio Lima 
por José Antonio Lima publicado 27/11/2013 06:33, última modificação 27/11/2013 09:31 
 
Orlando Sierra / AFP

Honduras polícia
Policiais fazem a segurança do Supremo Tribunal Eleitoral de Honduras, em Tegucigalpa, na segunda-feira 25
Em documentos de instituições como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch sobram relatos de abusos cometidos contra opositores do novo regime e minorias. Camponeses, líderes indígenas e afrodescendentes se tornaram alvo de ameaças e matadores de aluguel. Em diversos casos de morte, os suspeitos são grandes proprietários de terras, muitos dos quais contribuíram com o golpe. Ativistas LGBT, advogados, juízes e a imprensa também sofrem. Entre 2010 e 2012, 22 jornalistas foram executados.

A violência política cresceu apesar de Honduras, em tese (e de acordo com o governo dos Estados Unidos, que apoiou o golpe), ter entrado em um caminho democrático. Ainda em 2009, em eleições boicotadas pela oposição, Porfirio Lobo Sosa assumiu a presidência. Seu governo pouco fez para acabar com a impunidade dos assassinatos políticos e também não conseguiu agir contra a corrupção policial, escancarada pela transformação de Honduras em ponto de passagem obrigatório do tráfico de drogas. Segundo o Departamento de Estado dos EUA, 87% dos voos com cocaína que saem da América do Sul passam por Honduras. A região preferida dos traficantes é a Costa dos Mosquitos, no Atlântico, remotamente povoada e onde praticamente não há presença do Estado. Em algumas de suas missões, a polícia local é acompanhada pelo DEA, o departamento antidrogas dos EUA. Em maio de 2012, uma ação conjunta das duas polícias na Costa dos Mosquitos deixou quatro civis mortos, sendo duas grávidas. Ninguém foi punido.

Além de não combater os crimes, a polícia hondurenha é acusada de ser conivente com vários deles e ter alianças com gangues como a Mara Salvatrucha e 18th Street. Esses grupos, parceiros de cartéis mexicanos de drogas, agem em cidades como Tegucigalpa, a capital, e San Pedro Sula, a mais violenta do país, realizando sequestros e extorsões, entre outros crimes.

Integrante do establishment que assumiu o país após a queda de Zelaya, Orlando Hernández, apoiador do golpe de 2009 e atual presidente do Congresso, baseou sua campanha no combate ao crime. Prometeu “fazer o que for preciso para recuperar a paz e a tranquilidade” e colocar “um soldado em cada esquina”. Hernández ainda apresentou um projeto para criar uma Polícia Militar em Honduras e quer mudar a Constituição do país para autorizar o Exército a realizar buscas nas casas de suspeitos e investigar crimes. Entre os nove candidatos a presidente, o conservador foi o único a não assinar um documento público que pedia a criação de uma força policial profissional, civil e não militar, que respeite direitos humanos e transparência. Para seus rivais na eleição, entre eles Xiomara Castro, mulher de Zelaya e apoiada por Luiz Inácio Lula da Silva, essas são medidas que abrem espaço para novas violações do Estado de direito em Honduras.

Piora o temor dos críticos o fato de Orlando Hernández ter mostrado disposição para ir longe ao cumprir suas promessas. Em dezembro passado, liderou um “golpe técnico” que afastou, ao mesmo tempo, quatro juízes da Suprema Corte que avaliavam como inconstitucional o expurgo realizado por Porfirio Lobo na polícia hondurenha. Ao contrário do que pensavam muitos, o golpe de 2009 não serviu para instaurar a democracia em Honduras, mas pode ter ajudado a torná-la inviável.



Carta Capital

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