sexta-feira, 29 de abril de 2016

O preço da condescendência do STF com a farra grotesca em torno do impeachment. Por Carlos Fernandes

Postado em 28 Apr 2016


Os eminentes Gilmar e Mello


Não existe almoço grátis.

O Nobel de economia, Milton Friedman, utilizou essa expressão para mostrar que são os impostos cobrados da população que financiam os gastos e investimentos públicos de um governo.

A política brasileira que possui a impressionante habilidade de inverter e subverter toda e qualquer lógica dos mais sólidos fundamentos econômicos, jurídicos e sociais nos mostra que por aqui esse termo tem uma aplicação bem mais abrangente e bem menos republicano, digamos assim.

Vejamos. Do ponto de vista jurídico, não há qualquer argumento plausível que explique o fato do STF ainda não haver, no mínimo, afastado Eduardo Cunha de suas funções enquanto presidente da Câmara dos Deputados.

O estoque de manobras, abusos, afrontas, desrespeitos e intimidações que EC vem promovendo a cada novo dia parece não ter limites. Mesmo assim, a Suprema Corte do país continua na mais inquietante inépcia diante todo um Parlamento afundado em denúncias enquanto conduz mais um golpe na democracia brasileira.

Mas lembremos que não existe almoço grátis. A condescendência do STF com a farra grotesca em torno do impeachment tem o seu preço. Entre os gritos de “sim” justificados por “Deus”, pela “esposa” e pelos “filhos”, formou-se também a maioria necessária na Câmara para aprovar o reajuste salarial do judiciário.

Trata-se de uma das famosas pautas-bomba lançadas pelo nosso bom e velho Cunha para desestabilizar ainda mais as contas públicas. A medida prevê um aumento de 53% a 78% nos vencimentos dos servidores do judiciário e magistrados. Ministros do STF incluídos, naturalmente.

Quanto à responsabilidade fiscal tão defendida oportunamente pelos arautos da ética e da moralidade, nesse caso não vem ao caso. Segundo as previsões do Ministério do Planejamento, o acordo dos cavalheiros, se de fato aprovada, custará aos cofres públicos R$ 5,3 bilhões ainda em 2016 e chegará a R$ 36,2 bilhões até 2019.

Pois é! Poderes independentes e soberanos auxiliados por instituições isentas, técnicas e imparciais são para nações que não admitem que uma quadrilha de ladrões hipócritas subjuguem a Carta Magna e a vontade expressa das urnas. Parece não ser o caso do Brasil.

O pior, porque sempre pode ser pior, é que a conta para a deposição de uma presidente democrática e legitimamente eleita não está sendo cobrada apenas pelo poder judiciário. A digníssima bancada BBB -boi, bala e bíblia – também já apresentam as suas faturas.

Por terem votado em peso a favor do impeachment, a romaria em encontro à Temer já começou. O pastor Silas Malafaia e afins estiveram com o vice-presidente no palácio do Jaburu para orar e abençoar o “eleito” por 1% dos votos. Não sem cobrar o seu dízimo como de costume.

Exigiram a aprovação do Estatuto da Família, o fim do Estatuto do desarmamento com o livre comércio, posse e utilização de armas e como não poderia deixar de faltar, mudanças nas regras de demarcações de terras indígenas. Retrocessos e nada mais.

Já a cúpula do PSDB e DEM também não deixou barato. Para um apoio irrestrito ao governo Temer, exigem que a pauta neoliberal que fez o país se ajoelhar três vezes ao FMI seja seguida à risca. Até o ex-presidente Collor já entregou um “Plano de Reconstrução” ao principal beneficiário do golpe. É realmente um filme de horror.

O preço que todos nós teremos que pagar se Michel Temer assumir realmente a presidência da república será assombroso. Soma-se aos retrocessos econômicos e sociais, o desmantelamento das operações de combate à corrupção. Afinal de contas, estamos falando do PMDB.

Retirar Dilma do lugar que a democracia lhe reservou sob o estupro da Constituição Federal custará um valor que ninguém deveria estar disposto a pagar. Porque, definitivamente, não existe almoço grátis.

Sobre o AutorEconomista com MBA na PUC-Rio, Carlos Fernandes trabalha na direção geral de uma das maiores instituições financeiras da América Latina


Diário do Centro do Mundo   -   DCM

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