quinta-feira, 23 de junho de 2016

A Globo cortou a coletiva de Cunha, mas o retrato dele nunca sairá da parede da emissora. Por Kiko Nogueira

Postado em 22 Jun 2016

Cunha na coletiva cortada pela Globo (bela foto de Lula Marques)

A Globo encontrou um jeito maroto de justificar o ato de tirar do ar o pronunciamento de Cunha em sua defesa pública na terça (21).

Cunha convocou uma coletiva num hotel de Brasília. Em mais um abuso flagrante de suas prerrogativas, a TV Câmara fez a cobertura ao vivo.

O diretor, um pau mandado de EC chamado Cláudio Lessa, acabaria sendo demitido por Waldir Maranhão.

A GloboNews, sabendo de tudo isso de antemão, transmitiu o capitão do golpe tranqüilamente. Deu tempo de sobra de Cunha acusar Jaques Wagner de tentar compra-lo, se gabar de destruir o PT etc — até que falou mal da emissora.

“Todos os dias, o William Bonner arranja alguém para falar de mim. Se eu pegar as matérias do ‘Jornal Nacional’, em cada dia tem uma pessoa diferente, mas elas acabam se repetindo. Acho que fazem um revezamento”, disse sozinho, ao centro da grande mesa vazia.

A GloboNews interrompeu o sinal pouco depois. O ex-presidente da Câmara ainda seguiu: “O jornal me pede notas faltando poucos minutos para exibir as reportagens. Quando a minha defesa entrega uma resposta, eles decidem restringir minha defesa a uma frase, quando anteriormente usaram minutos e mais minutos para me acusar”, afirmou.

Repito o que escrevi aqui:

Cunha é uma lembrança incômoda para a Globo. Aquele tio que organizou o churrasco durante anos e anos, fez vários serviços sujos, ganhou salvo conduto, mas que tornou-se um problema grande demais e precisa ser queimado.

É o mesmo tratamento dispensado a ex-sócios caídos em desgraça, como Ricardo Teixeira, da CBF, poupado até a roubalheira ficar insustentável.

No começo de 2015, sua eleição para a presidência da Câmara foi festejada. “Aborto e regulação da mídia, só pode cima do meu cadáver”, declarou ele, deixando claro que estava ali pelos amigos e para os amigos.

Numa matéria do Globo chamada “Os Passos de Cunha”, assim é descrita a maneira como ele conheceu a mulher:

A dedicação de Cunha a Collor rendeu-lhe a presidência da Telerj, antiga companhia telefônica do Estado do Rio. Foi na época que conheceu a atual mulher Cláudia Cruz. Comandou a Telerj até 1993, quando foi exonerado após o impeachment de Fernando Collor.

Pronto.

Cunha começou a carreira na bandidagem no Rio de Janeiro. Não virou o que é por causa do lulopetismo. Nunca mereceu um minuto da atenção que a Globo dispensa aos meliantes petistas.

E, embora não esteja sendo mais mencionado atualmente, Cláudia, que pode ser presa também, foi funcionária entre 1989 e 2001. Apresentou Bom Dia Rio, Jornal Hoje, RJTV, Globo Ciência, Globo Comunidade, Jornal da Globo e Fantástico.

Em 10 de abril de 2000, deu a notícia da demissão de seu marido da presidência da Companhia Estadual de Habitação, Cehab, por causa de denúncias de fraudes em contratos. Meses depois, seria defenestrada.

Segundo matéria da Folha, em 1992 o então presidente da extinta Telerj assinou um aditivo de 92 milhões de dólares a um contrato de 1989 com a NEC Brasil — fornecedora de equipamentos para telefonia controlada, na ocasião, por Roberto Marinho.

Não houve licitação. O aditivo serviria para ampliar o número de terminais para 40 mil celulares (em 1993, um segundo aditivo foi assinado por 30 milhões de dólares por mais 40 mil terminais — 62 milhões a menos do que pagou Cunha).

Em julho de 2015, a colunista da Época Ruth de Aquino relatou o envolvimento dele num caso de violência doméstica. Se ela está contando a verdade, por que ninguém de sua revista foi atrás de um boletim de ocorrência?

Diz a jornalista que, quando dirigia O Dia, em 1996, ele teria ido parar numa delegacia da Barra da Tijuca com a ex-mulher Cristina Dytz depois de uma briga. “Cunha”, segundo Ruth, “fez de tudo para impedir a publicação. Telefonou primeiro para um editor, depois telefonou para o dono do jornal.

A reportagem saiu. Cunha travou com o jornalista um diálogo pesado ao telefone. E o levou à Justiça. Perdeu, porque nada havia ali que configurasse difamação ou injúria. Apenas fatos.”

Enquanto Cunha não foi apanhado com a boca na botija, Cláudia voou à vontade. Ele dançou na Cehab, ela dançou também. Cunha nadou de braçada na corrupção. A Globo não moveu um dedo de seu arsenal jornalístico para mostrar quem era EC.

Cunha deu o golpe, Janot pediu sua prisão, tornou-se o homem mais odiado do Brasil, virou radioativo — e agora pode ser suspenso das transmissões oficiais. Mas é uma fotografia na parede de seus comparsas e, já lembrou o poeta, como doi.


Sobre o Autor
Diretor-adjunto do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.


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