terça-feira, 30 de agosto de 2016

Dilma sai grande do capítulo final de uma história de apequenamento




POR FERNANDO BRITO · 30/08/2016



Dilma Rousseff, em sua história de vida, nunca foi uma “política”, embora à política tenha dedicado sua existência.

Foi e é, como mostrou ontem, uma mulher de convicções e de dignidade.

Cabeça erguida e dedo em riste, professoral, orgulhosa e forte, Dilma Rousseff encarou “olho no olho” seus juízes, recusando o “silêncio obsequioso de covardes”, escreve o Le Monde.

Não concordo com as análises de que ela tenha apenas “salvo a sua biografia”.

Tocou em todos os pontos essenciais, sem os arroubos oratórios que lhe seriam falsos não lhe dariam nada, porque eram dezenas de senadores sem causa brigando por frases grandiloquentes e ocas.

Disse o essencial.

Que o impeachment é produto do descontentamento das elites e a “eleição indireta” de quem não ganhava no voto.

Que foi Eduardo Cunha o instrumento para torna-lo viável.

Assumiu os erros de suas políticas econômicas, mas dentro de seu contexto. E, em boa parte, por fazer as políticas que mercado e mídia exigiam, em matéria de cortes, desoneração de tributos e elevação de juros.

Teve a decência e a correção de não atirar sobre seus auxiliares os atos pelos quais é injustamente acusada, sobretudo na questão dos pagamentos do Plano Safra, que era operado exclusivamente por Joaquim Levy ao longo de 2015 e foram liquidados quando já era Nélson Barbosa o Ministro da Fazenda.

Defendeu a apuração de todos os atos de corrupção, destacou o papel que ela e Lula tiveram no fortalecimento das instituições judiciais que, infelizmente, lançaram-se num arreganho fascista.

Sem sequer mencionar seu nome, imprimiu a marca da traição na testa de Michel Temer e, mais do que o PT, será ela a referência quando seu fracasso inevitável se evidenciar.

Reduziu o clube alegre do Senado àquilo que se tornou: um convescote de oportunistas que repetiam, com um pouco – mais nem tanto – o triste circo assistido na Câmara.

Não culpou o PT, nem mesmo aqueles que, usando o partido, entregaram-se ao jogo de vantagens que sempre foi a política brasileira.

E, ao seu jeito, serenamente, fez os parágrafos da carta-testamento de sua morte política anunciada, mas talvez não inevitável:

Entre os meus defeitos não está a deslealdade e a covardia. Não traio os compromissos que assumo, os princípios que defendo ou os que lutam ao meu lado. Na luta contra a ditadura, recebi no meu corpo as marcas da tortura. Amarguei por anos o sofrimento da prisão. Vi companheiros e companheiras sendo violentados, e até assassinados.

Na época, eu era muito jovem. Tinha muito a esperar da vida. Tinha medo da morte, das sequelas da tortura no meu corpo e na minha alma. Mas não cedi. Resisti. Resisti à tempestade de terror que começava a me engolir, na escuridão dos tempos amargos em que o país vivia. Não mudei de lado. Apesar de receber o peso da injustiça nos meus ombros, continuei lutando pela democracia.

Dediquei todos esses anos da minha vida à luta por uma sociedade sem ódios e intolerância. Lutei por uma sociedade livre de preconceitos e de discriminações. Lutei por uma sociedade onde não houvesse miséria ou excluídos. Lutei por um Brasil soberano, mais igual e onde houvesse justiça.
Disso tenho orgulho. Quem acredita, luta

Na era do cinismo, do farisaísmo, da falta de credibilidade, não há quem não tenha visto ontem: Dilma acredita.


Tijolaço

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